pagina
inicial->informações->esgoto
sanitário->Fundamentos
da Digestão Anaeróbia
FUNDAMENTOS
DA DIGESTÃO
ANAERÓBIA
No
processo de conversão da matéria orgânica em condições de ausência de oxigênio,
são utilizados aceptores de elétrons inorgânicos como NO3
( redução de nitrato ), SO2 ( redução de
sulfato ), ou CO2 ( formação de metano ). A formação de metano não
ocorre em ambientes onde o oxigênio, o nitrato ou o sulfato encontram-se
prontamente disponíveis como aceptores de elétrons. A produção de metano
ocorre em diferentes ambientes naturais tais como pântanos, solo, sedimentos de
rios, lagos e mares, assim como nos órgãos digestivos de animais ruminantes.
Estima-se que a digestão anaeróbia com formação de metano seja responsável
pela completa mineralização de 5 a 10% de toda a matéria orgânica disponível
na terra. A digestão anaeróbia representa um sistema ecológico delicadamente
balanceado, onde cada microrganismo tem uma função essencial.
As
bactérias metanogênicas desempenham duas funções primordiais: elas produzem
gás insolúvel ( metano ) possibilitando a remoção do carbono orgânico do
ambiente anaeróbio, além de utilizarem o hidrogênio, favorecendo o ambiente
para que as bactérias acidogênicas fermentem compostos orgânicos com a produção
de ácido acético, o qual é convertido em metano. A digestão anaeróbia de
compostos orgânicos é normalmente considerada um processo de dois estágios.
No primeiro estágio, um grupo de bactérias facultativas e anaeróbias,
denominadas
formadoras de ácidos ou fermentativas, convertem os orgânicos complexos em
outros compostos. Compostos orgânicos complexos como carboidratos, proteínas e
lipídios são hidrolisados, fermentados e biologicamente convertidos em
materiais orgânicos mais simples, principalmente ácidos voláteis.
No segundo estágio ocorre a conversão dos ácidos orgânicos, gás carbônico
e hidrogênio em produtos finais gasosos, o metano e o gás carbônico. Esta
conversão é efetuada por um grupo especial de bactérias , denominadas
formadoras de metano, as quais são estritamente anaeróbias. As bactérias
metanogênicas dependem do substrato fornecido pelas acidogênicas, configurando
portanto uma interação comensal. Uma vez que as bactérias metanogênicas são
responsáveis pela maior parte da degradação do resíduo, a sua baixa taxa de
crescimento e de utilização dos ácidos orgânicos normalmente representa o
fator limitante no processo de digestão como um todo.
MICROBIOLOGIA DA DIGESTÃO
ANAERÓBIA
A
digestão anaeróbia pode ser considerada como um ecossistema onde diversos
grupos de microrganismos trabalham interativamente na conversão da matéria orgânica
complexa em metano, gás carbônico, água, gás sulfídrico e amônia, além de
novas células bacterianas.
MATÉRIA
ORGÂNICA X BACTÉRIAS ANAERÓBIAS =
CH4 gás metano, CO2 gás carbônico, H2O água.
H2S gás sulfídrico, NH3 amônia e novas células.
Os
microrganismos que participam do processo de decomposição anaeróbia podem ser
divididos em três importantes grupos de bactérias, com comportamentos fisiológicos
distintos:
·
O primeiro grupo é composto de bactérias
fermentativas que transformam por hidrólise, os polímeros em monômeros, e
estes em acetato, hidrogênio, dióxido de carbono, ácidos orgânicos de cadeia
curta, aminoácidos e outros produtos como glicose;
·
O segundo grupo é formado pelas bactérias
acetogênicas produtoras de
hidrogênio, o qual converte os produtos gerados pelo primeiro grupo ( aminoácidos,
açucares. ácidos orgânicos e álcoois
) em acetato, hidrogênio e dióxido de carbono;
·
Os produtos finais do segundo grupo
são os substratos essenciais para o terceiro grupo que por sua vez constitui
dois diferentes grupos de bactérias metanogênicas. Um grupo
usa o acetato, transformando-o em metano e dióxido de carbono , enquanto
o outro produz metano, através da redução do dióxido de carbono.
Embora
o processo de digestão anaeróbia seja simplificadamente considerado como de
duas fases, este pode ser subdividido em quatro fases principais, como a Hidrólise,
Acidogênese, Acetogênese e Metanogênese
HIDRÓLISE
Uma
vez que as bactérias não são capazes de assimilar a matéria orgânica
particulada, a primeira fase no processo de degradação anaeróbia consiste na
hidrólise de materiais particulados complexos ( polímeros ) em materiais
dissolvidos mais simples ( moléculas menores ) os quais podem atravessar as
paredes celulares das bactérias fermentativas. Esta conversão de materiais
particulados em materiais dissolvidos é conseguida através da ação de
exoenzimas excretadas pelas bactérias fermentativas hidrolíticas. Na
anacrobiose, a hidrólise dos polímeros usualmente ocorre de forma lenta, sendo
vários os fatores que podem afetar o grau e a taxa em que o substrato é
hidrolisado ( Lettinga et al., 1996 e
Chernicharo – Reatores Anaeróbios ): temperatura
operacional do reator; tempo de
residência do substrato no reator; composição do substrato
( ex.: teores de lignina, carboidrato, proteínas e gordura ); tamanho
das partículas; pH do meio; concentração de NH4+-N;
concentração de produtos da hidrólise ( ex.: ácidos graxos voláteis
).
ACIDOGÊNESE
Os
produtos solúveis oriundos da fase de hidrólise são metabolizados no interior
das células das bactérias fermentativas, sendo em diversos compostos mais
simples, os quais são então excretados pelas células. Os compostos produzidos
incluem ácidos graxos voláteis, álcoois, ácido lático, gás carbônico,
hidrogênio, amônia e sulfeto de hidrogênio, além de novas células
bacterianas. Como os ácidos graxos voláteis são o principal produto dos
organismos fermentativos, estes são usualmente designados de
bactérias fermentativas acidogênicas. A acidogênese é efetuada por um
grande e diverso grupo de bactérias fermentativas, a exemplo das espécies
Clostridiun e Bacteroids. As primeiras constituem uma espécie anaeróbia que
forma esporos, podendo dessa forma, sobreviver em ambientes totalmente adversos.
As bacteróids encontram-se comumente presentes nos tratos digestivos,
participando da degradação de açúcares e aminoácidos. A maioria das bactérias
acidogênicas são anaeróbias estritas, mas cerca de 1% consiste de bactérias
facultativas que podem oxidar o substrato orgânico por via oxidativa.
Isso é particularmente importante, uma vez que as bactérias estritas são
protegidas contra a exposição ao oxigênio eventualmente presente no meio (
Van Haandel & Lettinga et al.
1996 e Chernicharo ).
ACETOGÊNESE
As
bactérias acetogênicas são responsáveis pela oxidação dos produtos gerados
na fase acidogênica em substrato apropriado para as bactérias metanogênicas.
Dessa forma, as bactérias acetogênicas fazem parte de um grupo metabólico
intermediário que produz substrato para as metanogênicas. Os produtos gerados
pelas bactérias acetogênicas são o hidrogênio, o dióxido de carbono e o
acetato. Durante a formação dos ácidos acético e propiônico, uma grande
quantidade de hidrogênio é formada, fazendo com que o valor do ph no meio
aquoso decresça. De todos os produtos metabolizados pelas bactérias acidogênicas,
apenas o hidrogênio e o acetato podem ser utilizados diretamente pelas metanogênicas.
Porem pelo menos 50% da DQO biodegradável é convertida em propianato e
butirato, os quais são posteriormente decompostos em acetato e hidrogênio pela
ação das bactérias acetogênicas.
METANOGÊNESE
A
etapa final no processo global de degradação anaeróbia de compostos orgânicos
em metano e dióxido de carbono é efetuada pelas bactérias metanogênicas. As
metanogênicas utilizam somente um limitado número de substratos, compreendendo
ácido acético, hidrogênio /dióxido de carbono, ácido fórmico, metanol,
metilaminas e monóxido de carbono. Em função de sua afinidade por substrato e
magnitude de produção de metano, as
metanogênicas
são divididas em dois grupos principais, um que forma metano a partir de ácido
acético ou metanol, e o segundo que produz metano a partir de hidrogênio e dióxido
de carbono, como a seguir:
-
bactérias utilizadoras de acetato (
acetoclásticas );
-
bactérias utilizadoras de hidrogênio ( hidrogenotróficas ).
Além
das fases descritas anteriormente, o processo de digestão anaeróbia pode
incluir, ainda, uma outra fase, dependendo da composição química do despejo a
ser tratado. Despejos que contenham compostos de enxofre são submetidos à fase
de sulfetogênese ( redução de sulfato e formação de sulfetos ), conforme
descrito a seguir:
SULFETOGÊNESE
A
produção de sulfetos é um processo no qual o sulfato e outros compostos a
base de enxofre são utilizados como aceptores de elétrons durante a oxidação
de compostos orgânicos. Durante este processo, sulfato, sulfito e outros
compostos sulfurados são reduzidos a sulfeto, através da ação de um grupo de
bactérias anaeróbias estritas, denominadas bactérias redutoras de sulfato (
ou bactérias sulforedutoras ). As bactérias sulforedutoras são consideradas
um grupo muito versátil de microrganismos, capazes de utilizar uma ampla gama
de substratos, incluindo toda a cadeira de ácidos graxos voláteis, diversos ácidos
aromáticos, hidrogênio, metanol, etanol, glicerol, açúcares, aminoácidos, e
vários compostos fenólicos. As bactérias sulforedutoras dividem-se em dois
grandes grupos Bactérias sulforedutoras que
oxidam seus substratos de forma incompleta até o acetato e Bactérias
sulforedutoras que oxidam seus substratos completamente até o gás carbônico.
( Visser, 1995 e Chernicharo)
VANTAGENS
DOS PROCESSOS
ANAERÓBIOS
·
Baixa produção de lodo, cerca de
5 a 10 vezes inferior a que ocorre nos processos aeróbios;
·
Não há consumo de energia elétrica,
uma vez que dispensa o uso de bombas, aeradores, válvulas solenóides, painéis
elétricos etc.
·
Baixa demanda de área, reduzindo
os custos de implantação;
·
Produção de metano, um gás
combustível de elevado teor calorífico;
·
Possibilidade de preservação da
biomassa ( colônia de bactérias anaeróbias ) , sem alimentação do reator,
por vários meses, ou seja, a colônia de bactérias entra em um estágio de
endogenia, sendo reativada a partir de novas contribuições. A titulo de
exemplo, podemos citar as casas de praia ou de campo que ficam longos períodos
sem nenhuma contribuição, e a partir do uso dessas residências, o sistema
volta a operar normalmente.
·
É importante frisar, que
contrariamente ao processo anaeróbio, nos processos
aeróbios, onde as bactérias dependem do oxigênio que é injetado através
de aeradores, a falta de energia elétrica ou queima de motor, coloca todo o
sistema em colapso, uma vez que não havendo oxigênio, perde-se todo o campo
biológico ( morrem todas as bactérias aeróbias )
DEMANDA POR SISTEMAS DE
TRATAMENTO LOCAL
É
de conhecimento amplo a crise que atravessa o saneamento no Brasil, conforme foi
identificado pelas pesquisas realizadas pela ABES e pelo IBGE no final dos anos
80 e inicio dos anos 90. Os dados referentes ao esgotamento sanitário são
alarmantes, indicando índices de cobertura da população, por redes coletoras
de apenas 30%, e um percentual de municípios que possuem estações de
tratamento inferior a 10%.
Mesmo
nos municípios que se incluem nesta pequena parcela, em geral, as estações de
tratamento atendem a apenas uma parte da população, muitas vezes as eficiências
são reduzidas e problemas operacionais são freqüentes. ( Barros et al., 1995
).
Diante
desse enorme déficit sanitário, aliado ao quadro epidemiológico e ao perfil sócio-econômico
das comunidades brasileiras, constata-se a necessidade por sistemas locais e
simplificados, de coleta e tratamento dos esgotos.
Estes
sistemas devem conjugar baixos custos de implantação e operação,
simplicidade operacional, índices mínimos de mecanização e sustentabilidade
do sistema como um todo.
Nesse
sentido, as seguintes alternativas, dentre outras, devem ser consideradas:
*
sistemas individuais de tratamento e disposição de excretas e esgotos, a
exemplo de:
-
fossa seca nas suas diversas modalidades;
-
tanque séptico + infiltração no solo;
-
tanque séptico + filtro anaeróbio.
*
sistemas coletivos de tratamento de esgotos, a exemplo de :
-
lagoa de estabilização;
-
aplicação no solo;
-
tanque séptico + filtro biológico anaeróbio;
-
reator anaeróbio de fluxo ascendente.
No
que se refere aos sistemas coletivos de tratamento de esgotos, embora existam
outras alternativas, que possam ser utilizadas, entende-se que, atualmente, no
Brasil, as quatro relacionadas acima encontram uma maior aplicabilidade.
De
um modo geral, todas as quatro atendem, em maior ou menor grau, aos principais
requisitos que devem ser observados num estudo técnico - econômico de escolha
de alternativas ( adaptado de Von Sperling, 1995 e Lettinga 1995 ):
·
Baixo custo de implantação;
·
Elevada sustentabilidade do
sistema. Pouca dependência de fornecimento de energia, peças e equipamentos de
reposição;
·
Simplicidade operacional, de
manutenção e de controle (operadores e engenheiros altamente especializados );
·
Baixos custos operacionais;
·
Adequada eficiência na remoção
das diversas categorias de poluentes ( Matéria orgânica biodegradável, sólidos
suspensos, nutrientes e patogênicos) ;
·
Pouco ou nenhum problema com a
disposição do lodo gerado na estação;
·
Baixos requisitos de área;
·
Existência de flexibilidade em
relação, às expansões futuras e ao aumento de eficiência;
·
Possibilidade de aplicação em
pequena escala ( sistemas descentralizados ) com pouca dependência da existência
de grandes interceptores;
·
Fluxograma simplificado de
tratamento ( poucas unidades integrando a estação )
·
Elevada vida útil;
·
Ausência de problemas que causem
transtorno à população vizinha;
·
Possibilidade de recuperação de
subprodutos úteis, visando sua aplicação na irrigação e na fertilização
de culturas agrícolas;
·
Existência de experiência prática.
PROGRAMAS EM ANDAMENTO
Pesquisas
e desenvolvimento de reatores anaeróbios ; Programa de Pesquisa em Saneamento Básico
( PROSAB )
Segundo
Chernicharo, este programa, iniciado em 1996, visa apoiar o desenvolvimento de
pesquisa nas áreas de abastecimento de água, águas residuárias e resíduos sólidos.
O programa é financiado pela FINEP / MCT, em ação conjunta com
CNPq, Caixa
Econômica Federal
e Secretaria
de Política Urbana do
Ministério do
Planejamento e Orçamento
( SEPURB) .
Na
área temática “águas residuárias “foi definido o seguinte tema para o
primeiro ano de trabalho: Tratamento de esgotos sanitários processos anaeróbios
e por disposição controlada no solo. As
pesquisas neste tema estão sendo feitas pelas instituições:
-
Escola de Engenharia de São Carlos – Depto. de Hidráulica e
Saneamento;
-
Pontifícia Universidade Católica do Paraná – Instituto de Saneamento
Ambiental;
-
Universidade de Campinas - Depto. de Hidráulica e Saneamento;
-
Universidade Federal de Minas Gerais – Depto. de Engenharia Sanitária
e Ambiental;
-
Universidade Federal da Paraíba – Centro de Ciências e Tecnologia /
EXTRABES;
-
Universidade Federal do Rio Grande do Norte – Depto. de Engenharia
Civil e de Engenharia Química;
-
Universidade Federal do Rio Grande do Sul – Instituto de Pesquisas Hidráulicas;
GTZ
/ TBW Supraregional
Sectoral Project
Este
programa vem sendo desenvolvido pela empresa alemã TBW Gmbh, em cooperação
com a GTZ –Agência de cooperação
técnica da Alemanha, tendo
como principal objetivo a difusão da tecnologia anaeróbia para o
tratamento de águas residuais domésticas e industriais e também de resíduos
sólidos.
NOMENCLATURA
DE REATORES
ANAERÓBIOS
A
denominação de alguns tipos de reatores no Brasil, notadamente os de manta de
lodo, é sem dúvida bastante confusa. Esses reatores, que na sua versão mais
aperfeiçoada tiveram sua origem na Holanda, na década de setenta, após
trabalhos desenvolvidos pela equipe do Prof. Gatze Lettinga, na Universidade de
Wageningen, foram denominados de reatores UASB
- UPFLOW
ANAEROBIC SLUDGE
BLANKET REATORS
Na
tradução para o português, os mesmos deveriam ser denominados REATORES ANAERÓBIOS
DE FLUXO ASCENDENTE (RAFA) e MANTA DE LODO. No Brasil tem sido divulgadas novas
terminologias para a identificação desse tipo de reator, sendo que pelo menos
cinco siglas são de uso freqüente em nosso meio, cada qual com suas características
específicas:
-
RAMA - REATOR
ASCENDENTE DE MANTA ANAERÓBIA;
-
DAFA
- DIGESTOR
ANAERÓBIO DE FLUXO ASCENDENTE;
-
RAFA
- REATOR
ANAERÓBIO DE FLUXO ASCENDENTE;
-
RALF
- REATOR
ANAERÓBIO DE LEITO FLUIDIFICADO;
-
UASBALL
- REATOR ANAERÓBIO DE FLUXO ASCENDENTE ATRAVÉS DE LEITO DE LODO.
|